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- Publicado em 12 julho 2016

O cemitério de Textom, localizado no Município da Matola, como tantos outros cemitérios do País, mostra-se um local invadido pelo espírito comercial que caracteriza os tempos modernos. Difícil é mensurar a distância que separa a “casa dos eternos” e o local do comércio de flores e água. A primeira vista a confusão que nos salta pelos olhos é a de saber onde começa e termina o cemitério e onde começa e termina a actividade comercial e vice-versa.
O “Correio da Matola” fez-se àquele cemitério para de perto fotografar com palavras e, em forma de reportagem este cenário que logo à primeira impressão visual faz acontecer a seguinte questão na mente: afinal quanto custa a (i) moralidade? Logo na entrada é possível ver munícipes comercializando flores de diversas cores (lindas e bem frescas), com características diversas e água em diferentes tamanhos de recipientes plásticos. Tudo tem o seu preço; os mesmos preços variam de acordo com a procura e o dia de semana. O preço inicial de flores é de 5 meticais para cima. A água num garrafão de 5 litros pode custar 10, 15 ou 20 meticais, de acordo com a intensidade da procura e o dia de semana.
Logo à entrada crianças, adultos, mulheres com crianças às costas procuram persuadir todos que se fazem ao cemitério para lhes comprar um leque de flores ou uma unidade de garrafão de água. O mais agonizante, no meio desse todo cenário, é o desrespeito que alguns vendedores têm tido com as famílias enlutadas nesse todo processo de venda e compra. É quase obrigatório passar por eles e comprar um leque de flores e/ou uma garrafão de água.
O respeito cede espaço ao comércio (i)moral. As crianças viram comerciantes de flores e água naquele lugar onde repousam nossos ente-queridos. Não respeitam o lugar e muito menos os que vivem com a dor de terem perdido alguém.
Diz-se, por alguns frequentadores assíduos, que este todo cenário de desorganização total tem sido fértil para acontecimentos imorais e actos criminais: há roubos de viaturas (mas com pouca frequência), furtos frequentes de carteiras e por vezes burlas protagonizadas pelos vendedores de flores e água.
Crise de valores ou meio de sobrevivência?
Ruth Vitorino (nome fictício de uma munícipe, que pediu falar ao “Correio da Matola” sob anonimato) residente no bairro Intaka-2 referiu que o actual cenário do cemitério de Texlon e não só, deve-se em grande parte ao esquecimento profundo dos valores morais e éticos. Declarou ainda que isso não é culpa do Município ou dos vendedores que ali se fazem sem respeito, mas sim é culpa de todos encarregados de educação. “Os actuais encarregados de educação não conversam com os seus educandos. Não lhes transmitem os valores morais e éticos certos e socialmente úteis. Gastam o tempo em trabalho e festas familiares, por isso assistimos essa pouca vergonha”. Ruth referiu ainda que este cenário pode-se inverter se houver uma aposta seria na educação moral e cívica sociais.
Por outro lado uma das vendedeiras de flores neste local, Tina, disse que desenvolve esse negócio para pôr à mesa pão para sua família. “Sou mãe solteira. E tenho filhos por criar, por isso não tinha outra saída. Há falta de emprego. Cansei de procurar emprego e vim vender flores. Quando não vão à escola, meus filhos, têm vindo ajudar-me” salientou. Para ela, esse negócio não deve ser marginalizado, mas sim respeitado e valorizado pois ajuda muitos que frequentam o cemitério. Quando interrogada sobre a presença de menores, vendendo naquele local, Tina preferiu não pronunciar-se. Apenas encheu o rosto com um sorriso.
Um motorista de um autocarro de transporte de passageiros, semi-colectivo, da via Anjo-Voador/Malhampsene, disse-nos que estas cenas desvalorizam aquele local sagrado. E o mais preocupante, segundo este condutor, é o facto de por ali passarem cidadãos estrangeiros que vêem fazer turismo em Maputo e Matola. O que para ele contribui para a construção de uma imagem negativa e falsa de Maputo e Matola e do País em geral.