Correio da Matola - Notícias da Matola Online

Escrevo este pequeno recado a ti, senhor cobrador. Tu que sempre me levas ao serviço sem precisar, fazendo o seu serviço. Tu que pela manhã negas transportar, em teu chapa, a mãe carregada de hortaliças, mas chegado a casa exiges a tua paciente esposa a mesma hortaliça na mesa. Escrevo a ti, meu cobrador, pela força que tens de fechar pelas nádegas a porta do teu mini-bus. Tu que sem mínimo de pudor, não te importas com as calças que te caiem pelo peso das moedas adormecidas nos bolsos traseiros. Tu que levas com todo gosto o futuro ministro, hoje aluno, que por imperativos pedagógicos traz uma gravata que lhe escorre até ao umbigo. O mesmo que com toda a humildade fala e comunica-se contigo através dum calão que também usa na escola. Tu que no meio da viagem cumprimentas o outro cobrador com um insulto bem refinado.

E te ris dos passageiros transportados em My-Loves sem amor. E tiras a mão pela janela como quem quer abraçar o vento e apertar com as unhas sujas o sol que escorre no alcatrão. Ninguém entende a tua linguagem. Tu que vês o teu chapa como um autêntico corpo elástico. Uma fera que devora a todos que nele entram e deixa-se vazio. Tu, cobrador, que conversas, a um tom de voz alto com o motorista enquanto um “Pandza” ou uma “Quizomba” ressoa no fundo.

Falas mal das mulheres, enquanto uma te espera em casa para partilhar contigo o amor que dorme na cama e acorda na mesa. Gosto de ti quando comentas e discutes política com o motorista e, passageiros espertos saindo, sob sua distracção, sem pagar. Tu que sem o saberes nos obrigas a estarmos juntos. A partilharmos, mesmo apertados, a mesma cadeira, com mesmo amor e carinho. Tu que sempre inventas paragens para levar contigo passageiros aflitos e nunca para os deixar. Admiro a tua rapidez quando o motorista manda-te recuperar a sua carta de condução num Polícia com uma nota de 50 meticais na mão. Rápido vais e ele adianta; encontrando-o na esquina a seguir. Tu que conheces todas as esquinas onde os PT’s instalam-se. Alertando ao motorista quando deve acelerar e acalmar o pedal. A ti dedico tudo o que as ruas negam-te. Tu que fazes do “manhã-tarde-noite” a tua Santíssima Trindade de rua. Tu, tu que alicias passageiros a fazerem-se ao teu chapa enquanto na mão esquerda tens notas do nosso metical dobradas e na direita um pão bem recheado.

Meu cobrador jovem; de olhos cheios de dias não dormidos; cheios de linhas vermelhas de sangue e cansaço; cheios de amor não recebido em cada viagem. Meu cobrador de cabelos encaracolados e esbranquiçados por restos de mantas de noites não passadas bem. Tu que levas o velho guarda cheio de sono a casa; tu que recebes, ainda quentes, 7 meticais do salário da empregada doméstica que cuida duma velha insuportável e não cuida do seu lar e filhos. Tu que levas com todo respeito e consideração o jovem universitário, aprumado, limpo, carregado de um monte de livros na pasta, à sua faculdade. O mesmo que, amanhã, depois de formado irá a China cobrar autocarros públicos e acabar com o teu emprego “informal”. Que dizer de ti, Senhor Cobrador? Das prostitutas, disfarçadas, que levas à Baixa, para baixarem a sua pobreza sem baixar as mulheres que são e muito menos o preço que serve de passaporte para elas. Gosto quando levas um velho à cadeira de frente ou quando no uso da sua educação fraterna chamas a senhora que vem do mercado; de mãe. Quando recebes os 7 meticais do jovem que vem do serviço e agradecesses com um sorriso de “Mano”;